9.14.2009

nunca pensara muito nos seus sonhos… nunca pensara sequer ter um, e sempre achara estranho ouvir as outras pessoas falar das suas esperanças para o futuro e daquilo que gostariam de vir a fazer. todas essas conversas lhe pareciam estranhamente ocas, como se todas as palavras não passassem disso, palavras, que não têm qualquer influência sobre nada.

por isso, nunca sonhou. e, por isso, a morte que lhe bateu à porta tão cedo não lhe causou qualquer transtorno. o facto de ter sido brutalmente assassinada não a incomodou minimamente. tampouco o facto de ter sido encontrada, praticamente azul, numa poça do seu próprio sangue, os olhos fitando sem ver o céu a fez perder a calma… estava morta, e que diferença fazia?

mas houve uma coisa que a incomodou… uma pequena coisa, que poderia facilmente passar despercebida… ninguém compareceu no seu funeral, excepto a família (ou pelo menos assim o pensava ela)… mas não era como se estivesse a espera de outra coisa. afinal, ela não era propriamente alguém que gostava de estar com as outras pessoas.... o que a incomodou foi o facto de estar errada, e de não ter só a sua família presente. nunca o tinha visto, ou melhor, nunca se tinha dado com ele. trocaram algumas palavras, mas só isso…

então, porque estava ele ali? e mais, porque estava ele vestido de negro e com aquele ar tão infeliz? não fazia sentido… e isso perturbou-a… pela primeira vez, sentiu raiva de ter morrido, raiva de nunca ter querido viver…

porque, afinal, mesmo que ela não sonhasse, alguém sonhava com ela…